- Pois eu tenho pai e mãe, mas não tenho mais nada.
- Mais nada?
- Não tenho local de nascimento.
- E qual é o problema?
- Não percebes? A identidade não está completa. Todos precisamos de sentir qual a pertença, a relação do próprio com o mundo.
- Não vejo necessidade disso. Somos todos uma parcela de um Todo, todos contribuímos para o conjunto, por mais insignificante que seja o nosso pensamento, as nossas palavras ou as atitudes e acções que desenvolvermos.
- Pois, pois. Mas a nossa identidade só fica completa com um lugar, ou de nascimento ou de ligação sentimental. Ninguém gosta de sentir que não tem um país para registar, para amar, não ter ligação cultural e histórica com um povo. Não saber sequer o que é uma vivência de bairro, de cultura local.
- Queres dizer que falta integração social mais alargada que a da família íntima?
- Nós somos um conjunto, como os da matemática, e temos igualmente regras que nos permitem ampliar o nosso ser em relação a uma vivência pessoal-social.
- Mas podemos ter isso tudo por relação sentimental e não por relação administrativa.
- Pois podemos, mas algo embaraça esse elo quando falta o registo comum.
- Talvez sirva de consolo o lembrar todos os que foram, e são, massacrados por pertencerem a determinada política, ou país, sem, de modo algum, terem tido possibilidade de escolha quanto às atitudes a tomar em casos de conflito.
- Não interessa, há a sensação, ou não há, de elo social comum que ultrapassa o martírio para se fixar no conjunto a que se pertence.
- Resumindo, referes-te à importância do sentimento de exclusão ou de admissão para o equilíbrio do ser.
- Nem mais!